A alta do dólar pode fundamentar pedido de reequilíbrio econômico-financeiro de contrato de concessão de serviço público?
O reequilíbrio econômico-financeiro do contrato é possível quando fatos supervenientes à celebração do contrato inviabilizem a execução do objeto tal como pactuado. Tais fatos devem estar enquadrados na álea extraordinária e extracontratual, podendo ser decorrentes de (art. 124, II, d, da Lei n°14133/2021 e art. 65, II, d, da Lei n° 8666):
- Força maior ou caso fortuito;
- Fato do príncipe, como por exemplo criação, alteração ou extinção de tributos;
- Fato da Administração
- Fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis
A variação cambial é circunstância enquadrável na última hipótese.
Como regra, entende-se que a variação da moeda estrangeira, dentro dos parâmetros usuais de flutuação da taxa de câmbio, não justifica o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, por estar inserida no risco assumido pelo particular no momento da celebração do contrato junto à Administração Pública. Nesse sentido, importante observar que a Lei n° 14.133/2021, em seu art. 92, inciso XV, impõe que o contrato preveja cláusula que estabeleça “as condições de importação e a data e a taxa de câmbio para conversão”, enquanto o art. 103 prevê uma série de regras a serem consideradas na alocação dos riscos contratuais.
Há, no entanto, situações excepcionais, nas quais a mudança na política cambial e no cenário econômico ocorrem de forma expressiva e abrupta, a onerar excessivamente o contratado. Em tais casos, o Tribunal de Contas da União e o Superior Tribunal de Justiça já se manifestaram pela possibilidade de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado entre o particular e o Poder Público, com fundamento na Teoria da Imprevisão. Nesse sentido, podemos mencionar o precedente do STJ no RESP n° 1.433.434 e o Acórdão n° 1431/2017, proferido em Consulta pelo Plenário do TCU.
Constata-se da jurisprudência desses dois órgãos que a aplicação da Teoria da Imprevisão para o fim de reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos perpassa a análise, no caso concreto, de três pressupostos principais:
👉 A flutuação cambial foge à normalidade do regime de câmbio flutuante?
👉 A variação do câmbio, como fato previsível, é de consequências incalculáveis, assim compreendidas as consequências cuja previsão não seja possível pelo gestor médio quando da vinculação contratual?
👉 lteração no valor da moeda acarretou, naquele caso específico, onerosidade excessiva no contrato a ponto de ocasionar um rompimento na equação econômico financeira, nos termos previstos no art.?
De janeiro/2024 a novembro/2024, a cotação de compra do dólar sofreu um aumento de mais de 17%, segundo dados fornecidos pelo Boletim do Banco Central. Trata-se de aumento que, a depender do tipo de contrato público firmado com base em orçamento estrangeiro, tem aptidão de refletir nos custos do objeto do contrato de forma expressiva e imprevisível, a ponto de não ser considerado uma álea meramente ordinária. É em casos tais que o pleito de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato tem lugar, sendo necessário, sempre, que o contratado e seu advogado demonstrem de maneira detalhada a onerosidade excessiva incidente na operação.
Importante observar, ainda, que a nova Lei de Licitações, em seu art. 131, parágrafo único, dispõe que o pedido de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro deverá ser formulado ainda durante a vigência do contrato e antes de eventual prorrogação por meio de aditamento. O caput do mesmo dispositivo esclarece que a extinção do contrato não configurará impedimento ao reconhecimento do desequilíbrio, porém, em tal hipótese, a Administração deverá indenizar o contratado por meio de termo indenizatório.